"Uma atividade voluntária exercida dentro de certos e determinados limites de tempo e espaço, segundo regras livremente consentidas, mas absolutamente obrigatórias, dotado de um fim em si mesmo, acompanhado de um sentimento de tensão e alegria e de uma consciência de ser diferente de vida cotidiana." (Huizinga, Johan. Homo ludens: o jogo como elemento da cultura. 5ed. Saão Paulo: Perspectiva, 2007)
De todos os brinquedos que a vida me deu, o que mais me cativou foi o de jogar com as palavras. O jogo se faz completo quando escrevo e alguém replica, quando replico o que escrevem... É na intenção de reunir jogadores e assistência, que meu blog é feito.



quinta-feira, 31 de dezembro de 2015

Desreflexões sobre começos e fins.

A cultura começou o humano
e terminou a igualdade.
A liberdade é o fim da tutela
e o começo da solidão.
O tropeço é o começo da queda
e o fim do passo.
O fim da castidade
vem no começo do sexo.
O nó é o começo do choro
e o fim do laço.
O começo da amizade
é o fim da solidão. 
O ar está no começo
e no fim da explosão.
O joelho começa na coxa
e termina na perna.
A casca quebrada é o fim do ovo
e início do pássaro.
O trabalho destrói o ócio
e inicia o cansaço.
A muda é o começo da planta
e o fim da semente.

O ódio é o começo do fim
de quem o sente.
A pele é o fim do mundo
e o começo da gente.

O nascimento é o fim da gravidez
o peito finda a fome, até que comece outra vez...
o primeiro passo é o começo do fim do colo
a paixão começa onde termina a paz
e a paz começa... 
enfim, ninguém sabe mais
então para mim, tanto faz.

Pode vir, 2016. 
Com paixão, com começos e fins. 

Sem mais,
Elimacuxi.


segunda-feira, 28 de dezembro de 2015

Fartou-se no banquete de uma noite
cheirou, tocou, esfregou, arranhou
energicamente
lambeu, sugou,
mordeu, deglutiu.

Raiaram-lhe depois 
as razões e o dia:
e era finda a poesia.

À noite, entretanto,
quando só, no quarto quase escuro,
ainda mete os dedos na boca, 
um por vez
a língua minuciosa, escavando os cantos
em busca de um sabor que revele
um resquício daquela pele.

Consome-se assim, há semanas
dispensou o uso de pijamas
e já não lhe resta nenhuma
de suas falanges distais.

É noturna e disforme essa fome, fome, fome...
dessas que enlouquecem a um homem 
dessas 
que ninguém sente mais.

domingo, 27 de dezembro de 2015

Re-secando

há aves diversas
vento abundante e poeira em vórtices
velado silêncio sobre a melancolia cotidiana
mangas e limões se decompõem
caídos entre as flores
e eu me recomponho
revirando doces ócios
de amores decompostos.

meu corpo se adominga
lentamente se cava e se suspende
solta-se sem hora nem susto
celebra-se vivo, respira,
ressente.

de repente
suspiros provocados pela pele
saram
arrancados na raiz
por afiadas razões

e severamente
re-secamos.

sexta-feira, 18 de dezembro de 2015

 
quando o coração me vem na boca
já não é pouca a emoção que brota
o amor, a gente sabe, a gente nota
quando é faísca e já quer se espalhar
e há um terreno, um campo em que,
se ele nasce
não tem mais freio, não se pode evitar:
peito menino, pouco importando a idade
feito poeta é o meu jeito de amar
e eu bem sei: não tem conveniência
e eu bem sei o quanto ele pode arder
e eu bem sei, mas nada nada disso importa
quando me brota assim
um novo bem-querer.

Boudoir Noir

O lindo trabalho de Mel Masoni, da Revista Dénudé







Me resta a sombra do sabor
a cor de cada som
a textura do olhar baço
e o ruído do teu cheiro...

que memória te resta
do momento em que
minha boca
te abraça e te aquece
inteiro?

quarta-feira, 16 de dezembro de 2015

Salve a rainha


Salve a rainha o silêncio e o mistério
salve o calor de sua energia
salve a rainha da água e do ar
salve a rainha, memória, magia
salve a rainha dos povos da mata
salve a rainha que da vida trata
salve a rainha que sabe, conhece
salve a rainha que a tudo enobrece
salve a rainha que vive encantada
salve a rainha que veio, chamada
salve a rainha raiz céu e chão
salve a rainha luz na escuridão
salve a rainha que serve-se pura
salve a rainha que é cor, som, textura
salve a rainha que toca e que cura 
salve a rainha força e resistência
salve a rainha da sã consciência
salve a rainha mãe da própria lei
salve a rainha que vive sem rei
salve a rainha das selvas e areias
salve a rainha
que sou
e sereias.

terça-feira, 15 de dezembro de 2015

Des-pre-tensão

Imagem originalmente postada em biscatesocialclube.com.br

Com quanta graça e força
a vida, essa coisa torta
me atira assim, meio morta
nos teus meio-mortos braços.
E logo, sem embaraço
um lago que à alma afaga
nos lava e nos desafoga.

Os sustos desaceleram...

Esse instante que associa
pele, pulso, poesia
- desses que nem se diria
disponíveis hoje em dia -
com toda sua energia
nos tirou medo e cansaço,
desmentiu as leis do espaço
do dia sacou as horas...
felizes nós caminhamos
entre jovens e senhoras
e um dia
valeu por anos.

Sensíveis, desassombrados
nos cedemos solidários
sedentos e solitários
a saciar nossos cios
e eram tantos desafios
saudades, dores dementes
pecados impenitentes
cansaços, medos, enganos...
os lençóis formaram ondas
de um mar branco e bravio
onde juntos navegamos.

De lado muito trocamos
os nossos dois corpos lassos
e tanto fez o ar escasso
tanto fez se par ou passo
seriam a consequência:

com a doçura desse abraço
destroçamos nossa ausência
quebrando com o descompasso
da nossa (im)própria existência.